quarta-feira, 19 de julho de 2017

Jornalista iraniana narra divórcio de menina de 10 anos

02/11/09 - 06h39 - Atualizado em 02/11/09 - 06h40

Jornalista iraniana narra divórcio de menina de 10 anos


Katy Seleme.

Beirute, 2 nov (EFE).- A jornalista e escritora franco-iraniana Delphine Minoui conta a história de Nojoud Ali, uma menina iemenita de 10 anos que foi a um tribunal e obteve o divórcio do marido, mais de 20 anos mais velho que ela, com a ajuda e determinação do juiz.

Em entrevista à Agência Efe, a autora explica que "Nojoud, 10 anos, divorciada" é a prova de que, apesar da permanência destas práticas, que atentam contra os direitos mais elementares da infância e das mulheres, "há esperança" para as meninas que são obrigadas a se casar.

"Apesar de seu caso ser trágico, assim como, infelizmente, da metade das meninas do Iêmen, a coragem da pequena" foi o que incentivou Minoui a escrever o livro, conta.

A menina "quebrou um tabu e foi se refugiar em um tribunal para pedir o divórcio, depois que a casaram com um homem 30 anos mais velho, que abusava sexualmente dela".

"Teve a sorte de encontrar um juiz que aceitou ouvi-la, que se comoveu com sua história e prometeu ajudá-la, advertindo, no entanto, que a vitória não era certa", conta a escritora, cujo pai é iraniano e que vive no Líbano.

Cumprindo o prometido, "o juiz se mobilizou, contratou uma advogada especialista em direitos das mulheres, que divulgou o caso à imprensa e pressionou para que Nojoud recebesse o divórcio".

"Segundo estatísticas que encontrei na Universidade de Sana (capital do Iêmen), mais da metade das meninas no Iêmen se casa antes dos 18 anos e é comum ver menores de 11, 12 ou 13 anos carregando os filhos nos braços", narra.

Segundo ela, "isso faz parte da normalidade, não só no Iêmen, mas também em países como Afeganistão, Egito e outros da região", onde muitas vezes se impõe a lei do silêncio e transforma o tema em tabu.

No entanto, afirma que "o fabuloso por trás da tragédia de Nojoud é que há esperança, porque ela ousou fazer o que nunca ninguém tinha feito antes", como conta o livro, já traduzido para mais de 20 idiomas.

Para a jornalista, as dificuldades da vida das mulheres nesta região do mundo são devido a vários fatores, "entre eles, o religioso, já que, em muitos países, as leis são inspiradas na lei islâmica, ou sharia".

"Mas é um clichê atribuir a situação da mulher apenas à religião, já que existe também o fator tribal, onde prevalece a questão da honra, principalmente nas aldeias, onde e mal visto que uma menina cresça sem se casar", explica.

"Temem que brinque com outras crianças, que seja sequestrada por um homem, que tenha relações - não necessariamente sexuais - antes do casamento, por que estas coisas sujariam a honra da família, da tribo e do bairro", afirma a jornalista.

Outro fator para explicar os casamentos com meninas menores de idade é a pobreza.

"Tomemos o caso de Nojoud. Seu pai está desempregado, casou-se duas vezes e tem 16 filhos. Para ele, casá-la é livrar-se de uma carga, é uma boca a menos para alimentar", diz.

A educação também tem papel crucial e Minoui ressalta que o fenômeno acontece no Afeganistão ou no Egito, mas não no Irã - por exemplo -, onde a mulher tem acesso à educação.

"Mais de 90% das mulheres são escolarizadas e, com isso, já conseguiram a primeira etapa para sua liberdade e emancipação", opina.

Assim, "inclusive jovens de meios tradicionais, que vão ao colégio e à universidade, aprendem a refletir e a reivindicar seus direitos".

"Sem educação e sem consciência de seus direitos, quando um pai diz à filha que esta se casará amanhã, ela não sabe que tem direito de dizer não. A mulher é submetida e vê que a mãe e as irmãs maiores tiveram o mesmo destino", conta.

Mas há pessoas que lutam ativamente contra esta prática, mas, às vezes, a um preço muito alto.

"As mulheres que trabalham nas ONG são ameaçadas de morte, são emitidas fatwas (éditos religiosos) contra elas, acusam-nas de serem manipuladas pelo Ocidente e muitas acabam por abandonar", conta.

Além disso, a jornalista fala que, muitas vezes, "as autoridades não fazem fada para que as meninas tenham acesso à educação ou aos serviços de saúde. A maioria delas dá à luz em casa e o planejamento familiar é nulo".

No entanto, "o caso de Nojoud, que apareceu na imprensa local e nas televisões, contribuiu para que as coisas comecem a mudar, mas de modo muito lento".

Depois de Nojoud, outras menores de entre 10 e 11 anos no Iêmen obtiveram o divórcio.

"Isso é encorajador. Na Arábia Saudita, uma menina era casada com um homem 50 anos mais velho, mas a mãe soube do caso de Nojoud e pediu o divórcio para a filha, e conseguiu", afirma Minoui. EFE.


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